Se grandes enchentes não são exatamente novidade na bacia do Rio das Velhas, é também verdade que muitas delas causam estragos nas cidades do Quadrilátero Ferrífero. Sabará, Nova Lima e Raposos, Ribeirão das Neves e Santa Luzia são as cidades de alto risco de desastres ocasionados por chuvas segundo o AdaptaBrasil, totalizando 50% dos municípios da bacia nesse nível, apontam os ambientalistas Júlio Grillo e Euler Cruz.
“Já vimos grandes inundações nessas cidades, e a tendência é que elas se repitam mais frequentemente. “Por exemplo, no dia 8 de janeiro de 2022 houve uma chuva muito grande no Quadrilátero que inundou Raposos, e o Rio das Velhas subiu ao máximo já registrado. Houve vazão de 630 metros cúbicos por segundo registrado em Raposos, e só não registrou mais porque a água subiu tanto que afogou o pluviômetro.
Nos 45 anos em que eu estou lá, eu nunca tinha visto uma quantidade de chuva tão grande”, relembra Euler. E ele continua: “historicamente, o Quadrilátero, das regiões de Minas Gerais, é a que mais chove. E isso vai aumentar. Além disso, é a região que tem mais barragens e mais gente vivendo. Então, uma chuva intensa pode levar várias barragens. Aí, nós vamos perder o Rio das Velhas, como já perdemos o Paraopeba e o Doce “, avisa.
A diferença entre as tragédias que aconteceram com as barragens da Vale e da Samarco e a que pode acontecer no Rio das Velhas é que, no caso de ocorrer um grande volume de chuva concentrada que venha a romper uma ou mais barragens, a água da precipitação se juntaria aos rejeitos de minérios, carregando metais pesados até o Rio São Francisco.
“As zonas de autossalvamento e as manchas de inundação foram calculadas em cima do volume que há no reservatório de rejeitos. Se esse reservatório se rompe por um problema de chuvas extremas, a lama que sairá vai descer acrescida desse volume de chuvas. Ela vai ficar mais fluida, deixando as manchas de inundação mais largas, e a velocidade de descida do rejeito será muito maior”, previne Júlio.
TEMPESTADES
Ao El Niño, que causou as fortes chuvas no Sul, precederá a La Niña, que deve trazer tempestades para o Sudeste no verão. Alertas como esses que deram Julio Grillo e Euler Cruz podem ser vistos como exageros. Afinal, pessoas como eles frequentemente são chamadas de “ambientalistas xiitas” ou “cientistas malucos”. No entanto, como na frase vista um dia numa manifestação, “no começo de todo filme de desastre tem cientista sendo ignorado”.
No filme “Não olhe para cima”, um grupo de cientistas alerta para um imenso meteoro que fatalmente se chocará com o planeta. Ninguém lhes dá ouvidos. Diferentemente de um pedaço de rocha atingindo a superfície da Terra e extinguindo a vida em instantes, a destruição causada por crescentes eventos climáticos nos empurraria para um fim que levaria décadas, durante as quais passaríamos anos tentando negar o inevitável. Adaptar-se à emergência climática e proteger o meio ambiente é uma decisão urgente. Tomemos essa decisão enquanto há tempo.