Um homem, de 46 anos, foi condenado a 166 anos de prisão pelos crimes de estupro de vulnerável contra as quatro filhas, quando elas tinham entre 5 a 13 anos, de atentado violento ao pudor contra uma cunhada, dos 7 aos 15 anos e ainda contra uma vizinha e amiga das filhas, na época, com 8 a 9 anos, no município de São João da Lagoa, Norte de Minas.
O réu está preso no Presídio do bairro Jaraguá II, em Montes Claros desde 19 de fevereiro, quando o caso veio à tona. Em depoimento à Justiça, ele confessou a prática dos abusos sexuais contra as próprias filhas, a cunhada e a vizinha. A sentença foi assinada pelo juiz Marcos Antônio Ferreira, responsável pela Comarca de Coração de Jesus, à qual está vinculado São João da Lagoa. Neste mês, é realizada em todo país a campanha de combate ao abuso e à exploração sexual infantil – “Maio Laranja”.
O magistrado explica que, ao tomar conhecimento do caso, em fevereiro último, imediatamente, decretou a prisão preventiva do acusado. Ele lembra que, desde que passou a responder pela Comarca de Coração de Jesus, tem atuado de “forma incansável e rigorosa” no combate aos crimes contra a dignidade sexual “Quebrar o ciclo da violência significa convocar a sociedade a ouvir, ter empatia e cuidado com as crianças e adolescentes”, afirma.
VÍTIMA SE MUTILAVA – O condenado pelos crimes sexuais trabalhava como chapa de caminhão. O caso começou a ser investigado pela Polícia Civil de Coração de Jesus após os policiais receberem uma denúncia formulada pelo Conselho Tutelar do município de São João da Lagoa, em 23 de janeiro deste ano, referente à filha mais nova do homem, de 13 anos.
Inicialmente, os conselheiros entraram em contato com a mãe da vítima, que alegou desconhecer os fatos. Contudo, a mulher relatou que, desde os 9 anos, a menina apresentou mudanças de comportamento psicológicas e isolamento social, inclusive começado a se mutilar. Ainda em janeiro, foi instaurado um inquérito policial no qual a Polícia Civil reuniu elementos que comprovaram o crime contra a adolescente, e, ainda, identificou outras cinco vítimas.
Conforme a sentença, em depoimentos prestados à Justiça, as filhas do réu relataram como eram abusadas sexualmente pelo próprio pai. Elas disseram que o homem lhes oferecia presentes para não revelar os abusos. A reportagem tentou, mas não conseguiu contato com a defesa do sentenciado.
“As declarações das vítimas são verossímeis e não apresentam elementos fantasiosos, não havendo indícios de que elas tenham criado uma versão e agido com o objetivo de prejudicar o acusado. Pelo contrário, apenas descreveram, objetivamente, os fatos ocorridos, de forma lógica e com nexo, o que lhes confere coerência e consistência perante o conjunto probatório produzido”, sustenta o juiz Marcos Antônio Ferreira.
“Não há como negar a perversidade do acusado, que confessou a prática dos inúmeros abusos perpetrados durante anos contra as próprias filhas que conviviam com ele, que não denunciara por medo ou mediante promessas de recompensas feitas por ele”, observa.
Ao fazer as considerações na justificativa da condenação, o juiz lembra que o réu “tinha personalidade deturpada, pois, se utilizou de subterfúgios mentais, promessas de recompensa e até mesmo impingindo temor às vítimas, e ainda se aproveitando de parentesco e confiança das crianças para delas abusar sexualmente, para a satisfação de sua lascívia (excitação).
INOCÊNCIA ROUBADA – O juiz Marcos Antônio também afirma que o homem “roubou a inocência” das próprias filhas. Ao se mencionar os abusos contra uma das vítimas, ele relatou: “(…) considerando as circunstâncias em que os crimes foram praticados na residência das crianças e o modo de execução dos crimes, nos quais o acusado se aproveitou da relação de ascendia com a filha para roubar-lhe a inocência, praticando contra ela atos libidinosos diversos (…), praticados rotineiramente por um longo período mediante promessas de roupas, presentes e comidas, para que a vítima não relatasse os fatos a ninguém”.
“UMA REALIDADE TRÁGICA” – A violência sexual de crianças e adolescentes é uma realidade trágica, inclusive aqui no Norte de Minas, que precisamos prevenir e enfrentar de forma conjunta”, relata o juiz Marcos Antônio Ferreira, responsável pela Comarca de Coração de Jesus.
Ele afirma que, diante desse quadro, os órgãos que integram o Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGDCA) devem estar atentos a essa realidade, notadamente o Poder Judiciário. “Pois, somente assim poderemos garantir e proteger de forma integral o público infantojuvenil”.
Os dados da Campanha “Maio Laranja” apontam que a cada hora 3 crianças são abusadas no Brasil. Cerca de 51% têm entre 1 a 5 anos. Todos os anos 500 mil crianças e adolescentes são explorados sexualmente no nosso país e há dados que sugerem que somente 7,5% dos dados cheguem a ser denunciados às autoridades, ou seja, estes números, na verdade, são muito maiores.
O Juiz Marcos Antônio Ferreira lembra que, na maioria dos casos, os autores dos abusos sexuais são familiares e pessoas conhecidas das vítimas, conclui, que crimes como os ocorridos em São João da Lagoa não podem ficar impunes. “É preciso que o Judiciário atue de forma célere, efetiva e severa, mas, ainda assim, é fundamental que a sociedade também compreenda que é seu dever proteger as crianças e adolescentes, e denunciar, tão logo, percebam indícios de agressões, de mudanças de comportamento da criança e do adolescente”, relata o magistrado.